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Pesquisa na Suécia e Reino Unido mostra descompasso entre recomendações oficiais de consumo e a experiência dos bebedores

By CISA 07 Outubro 2025

Um estudo mostrou que indivíduos criam suas próprias definições de consumo de risco baseadas em experiências pessoais, não em quantidades recomendadas.

Um novo estudo publicado na revista BMC Public Health1 investigou como adultos que buscam reduzir o consumo de álcool percebem o "beber de risco" e interpretam as diretrizes oficiais de saúde. A pesquisa, conduzida com 308 participantes da Suécia e Reino Unido, revelou uma desconexão significativa entre as recomendações médicas e a forma como as pessoas realmente pensam sobre os riscos do álcool.

Metodologia e principais achados

Os pesquisadores analisaram respostas escritas de participantes que buscavam ajuda online para moderar o consumo. Quando questionados sobre sua definição de "consumo perigoso", os padrões identificados foram subjetivos, baseados na vivência dos bebedores e nas consequências do consumo, e não nas categorias abstratas das recomendações oficiais :

Definições baseadas em consequências, não em quantidades:

  • Perder o controle sobre quanto se bebe;
  • Usar álcool para lidar com depressão, ansiedade ou solidão;
  • Apagões de memória ("blackouts");
  • Prejuízos no trabalho, família ou relacionamentos;
  • Pensamentos obsessivos sobre a próxima bebida.

Notavelmente, poucos mencionaram quantidades específicas de álcool, e quando o fizeram, os números citados excediam significativamente as recomendações oficiais.

Reações às diretrizes oficiais

Após responderem sobre suas percepções pessoais, os participantes foram apresentados às diretrizes de seus países (máximo de 10 doses padrão/semana na Suécia; 14 unidades/semana no Reino Unido). As reações foram categorizadas em três padrões principais:

  1. Ceticismo (maioria): "Os limites são muito baixos, a maioria das pessoas que conheço bebe mais que 10 doses por semana";
  2. Negação: "Bebo acima do recomendado há 40 anos e ainda não sou alcoólatra";
  3. Ambivalência: "Sei que bebo demais e quero reduzir, mas é difícil".

Diferenças entre países

O estudo identificou distinções culturais importantes:

  • Participantes britânicos destacaram tipos específicos de bebida (destilados puros, shots) como marcadores de risco;
  • Participantes suecos enfatizaram mais aspectos cognitivos, como pensamentos intrusivos sobre álcool e perda de controle inibitório.

Essas diferenças podem refletir políticas distintas - a Suécia mantém monopólio estatal de vendas e restrições mais rígidas à publicidade.

Por que esses resultados importam

A pesquisa tem implicações diretas para saúde pública:

  1. Comunicação ineficaz: As diretrizes numéricas não ressoam com a forma como pessoas processam risco no dia a dia;
  2. Barreiras à prevenção: Quem não reconhece seu padrão como arriscado dificilmente buscará mudança;
  3. Necessidade de nova abordagem: Campanhas precisam abordar aspectos experienciais e emocionais, não apenas quantidades.

Recomendações práticas

Os autores sugerem que profissionais de saúde devem:

  • Discutir contextos e motivações do consumo, não apenas volumes;
  • Relacionar diretrizes a experiências concretas reconhecíveis;
  • Abordar indicadores como beber sozinho, para automedicação ou quando há perda de controle;
  • Reconhecer e trabalhar a ambivalência sobre mudança.

Limitações do estudo

A pesquisa focou em pessoas já motivadas a reduzir consumo, podendo não representar a população geral. Os participantes tinham idade média de 59 anos e maioria com educação universitária. Respostas foram relativamente curtas (média de 7-8 palavras), limitando uma maior profundidade da análise.

Conclusão

O estudo demonstra que existe uma lacuna entre como autoridades de saúde comunicam risco e como indivíduos percebem esse risco. Para aumentar a efetividade, diretrizes e campanhas preventivas precisam incorporar a linguagem experiencial que as pessoas usam naturalmente para avaliar seu próprio risco, com foco em consequências, controle e contexto, não somente em números abstratos de doses ou unidades.

Additional Info

  • Referências:

     1. Crawford J, et al. Personal perceptions of risky drinking and alcohol guidelines – a qualitative analysis. BMC Public Health. 2025;25:3049. DOI: 10.1186/s12889-025-24296-6

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